No sábado, 27 de fevereiro, venceu o prazo determinado pela Justiça em primeira instância para a entrega de moradias às famílias atingidas pelo crime das mineradoras Samarco, Vale e BHP, em Mariana (MG). As empresas deveriam entregar os reassentamentos coletivos de Bento Rodrigues e Paracatu de Baixo, duas comunidades completamente devastadas pelo rompimento da barragem de Fundão, e diversos reassentamentos familiares, destinados principalmente às pessoas que tiveram suas propriedades destruídas pelos rejeitos em seis comunidades da zona rural de Mariana. Entretanto, os atingidos, que já estão há cinco anos fora de suas casas, seguem sem casa.
Maria Geralda Oliveira da Silva, atingida de Paracatu de Baixo, relata que a perda da liberdade que tinha em sua comunidade é o que mais dói. Ela conta que antes do mar de lama destruir o distrito, seu pai era um homem forte e feliz, mas desde o rompimento da barragem foi forçado a viver fora de sua casa e se mantém num estado de tristeza profunda. “Hoje meu pai tem 90 anos, já passaram cinco anos, e toda hora que olho para o meu pai ele está chorando e me pergunta: ‘Eles já vão fazer a casa? Já estão fazendo? ’. Eu fico sem resposta e falo para ele ‘eles vão fazer pai, vão fazer as casas. Vai demorar muito tempo não’” .
Assim como as demais famílias que vivem em moradias provisórias há mais de cinco anos, Maria Geralda sabe que os reassentamentos estão longe de serem finalizados. Diversas pessoas ainda não puderam iniciar o projeto das suas casas e outras tantas seguem sem saber se receberão suas moradias, pois sequer têm lote definido nos reassentamentos. Para essas famílias, o descaso da Fundação Renova e das mineradoras que a controlam é o que leva a repetidos descumprimentos de prazos.
Para Gladston Figueiredo, coordenador da Assessoria Técnica aos atingidos (Cáritas MG), as justificativas dadas para os descumprimentos são tacanhas e não correspondem à realidade. “A restituição do direito à moradia, elemento fundamental para a reparação integral, vem sendo negada aos atingidos desde o rompimento. Desde a compra dos terrenos as empresas responsáveis pelo crime sistematicamente adotam posturas que atrasam o processo. E, sobretudo, aparentemente visando redução de gastos, não dialogam com atingidos e tampouco consideram suas demandas nas obras”.
O primeiro prazo para entrega das obras, apresentado pela própria Fundação Renova, foi 31 de março de 2019. O segundo, determinado pela Justiça, foi 27 de agosto de 2020. E a data 27 de fevereiro de 2021 já é o terceiro prazo para entrega dos reassentamentos, que seguem inconclusos. A Justiça determinou uma multa de R$ 1 milhão por dia de atraso a partir deste sábado. As mineradoras recorreram da decisão alegando que os atrasos são causados pelos processos de participação das famílias nas decisões e por dificuldades devido à pandemia da Covid-19. Ainda não há decisão do Tribunal quanto ao pedido das mineradoras. Vale lembrar que o lucro das empresas segue atingindo cifras bilionárias: a BHP teve lucro líquido de US$ 3,88 bilhões no segundo semestre de 2020 e, a Vale, de R$ 15,6 bilhões no terceiro trimestre de 2020.