Nem os tapetes coloridos de serragem, as rezas em coros e todos os ritos centenários podem reverter o impacto da crise econômica nas cidades históricas de Minas Gerais. Acostumados com a fama e uma boa demanda até mesmo em dias normais, esses municípios estão, agora, à procura de turistas. A semana santa que historicamente seria o boom para empresários dessas localidades, virou a ponta de um iceberg para muitos hotéis em Ouro Preto, Mariana, Tiradentes, São João del-Rei e Diamantina, onde, em muitas pousadas, a uma semana para a Sexta Feira da Paixão, não há nem a metade de quartos reservados. A situação vem desde 2014, quando esses locais passaram a viver na “busca por hóspedes”. Uma das estratégias adotadas foi a redução do preço das diárias em até 30%. Mas nem assim as pousadas voltaram a ficar lotadas.
“A hotelaria anda de mãos dadas com a economia. Quando uma vai mal, a outra segue pelo mesmo caminho”, avisa a presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis de Minas Gerais, Patrícia Coutinho. Com o mercado financeiro prevendo uma inflação acima de 8% ao ano, bem acima da meta do governo federal de 6,5%, o que tem corroído o orçamento das famílias, fazendo-as recuar nos gastos, muitos empresários do setor hotelereiro, segundo Patrícia, estão acuados. “Muitos estão com medo de investir e o turismo vai sofrendo com isso.”
Quem visita, hoje, Ouro Preto, na Região Central de Minas, sente o impacto. Os muitos turistas antes vistos pelas ladeiras estão desaparecendo. Diante da queda, que segundo empresários deve ter sido em média de 40% na taxa de ocupação, restou ao setor reduzir o valor das diárias, em média, em 30%. “Temos 22 acomodações e tem dias que não há ninguém nelas. Antes do segundo semestre de 2014, vínhamos mantendo uma média de 10 pessoas por semana”, comenta a gerente do Hotel Solar de Maria, Ana Paula Gomes de Carvalho. Ela tem apostado nas promoções para atrair a clientela. “Para se ter ideia, a diária de um apartamento standard aqui custava R$ 288 e a reduzimos para R$ 221. Um apartamento melhor custaria R$ 444, e passamos para R$ 332”, conta.
A mesma fórmula tem sido usada por César Tropia, dono da Pousada Mezanino, em Ouro Preto. Segundo ele, no ano passado, tinha reserva antecipada para todos os períodos do ano. “Agora, não tenho nada fechado para os próximos meses. A taxa de ocupação caiu em 40%, sendo otimista”, diz. Ele conta que, o micro-empresário, além da baixa procura, enfrenta os aumentos de várias contas, principalmente a de energia. “A minha diária já era uma das mais baixas da cidade e não tenho como reduzí-la. Cobro R$180, mas o meu custo de mantê-la é muito alto. A despesa na lavanderia, no fornecedor de alimentos aumentou. A cidade inteira está sentindo, desde o dono da mercearia até a dona que vende queijos para nós”, conta.
Tradicional no município, a Pousada do Mondego, que já hospedou grandes políticos, também vive dias ruins. O dono, Ricardo Pereira, se diz revoltado com a situação pela qual passa Ouro Preto e culpa a política econômica do governo federal pela situação. “A nossa queda no número de hóspede foi de 80%. Ouro Preto é Patrimônio Histórico da Humanidade, com maior conjunto barroco do planeta e o turismo aqui está no chão. Na semana santa, alugava as acomodações com um ano de antecedência. Agora, não. Estamos à beira de uma convulsão social”, comenta. Ricardo tem duas pousadas na cidade e diz que, como está fazendo reformas na Mondego, o que reduziu o número de quartos disponíveis, é possivel que, para a Páscoa, ele consiga uma lotação. “A minha Pousada D´Ouros ficou fechada seis meses por causa da baixa procura e a abro em eventos. Para a Páscoa, só há 50% dos quartos alugados”, diz, protestando que não vai baixar os valores de suas diárias, que chegam a R$ 802 pela suíte master.
O presidente do Sindicato dos Empregados em Turismo, Hospitalidade de Ouro Preto e Região, Otaviano Mendes, lembra que o carnaval não foi tão bom na cidade e diz que, além do cenário econômico, o setor sofre com a concorrência das repúblicas, nas quais muitos jovens preferem se hospedar. “Já tivemos um turismo muito forte aqui, onde havia inclusive, pousadas com diárias de R$ 1,2 mil. Hoje, a que cobrava este valor reduziu para R$ 480”, revela, dizendo que aqueles empresários que não diminuírem as tarifas vão perder clientes.
Bem perto dali, a situação é a mesma ou, talvez, pior. Em Mariana, a cerca de 20 quilômetros de Ouro Preto, a reclamação dos empresários é que a cidade, que recebia os funcionários de mineradoras, perdeu cerca de 70% da clientela no setor de hotéis. Isso porque a queda no preço do minério de ferro afetou muitas das empresas do setor. “A cidade está parada, ninguém compra nada. Já baixei minha diária de R$ 180 para R$160 e muitos colegas da área já falam em fechar as portas”, comenta Edson Antônio, dono da Pousada Rainha dos Anjos. No Hotel Providência, a queda foi a mesma e, segundo o gerente-geral, Antônio Dinis, foi preciso reduzir as tarifas, de R$ 230 para R$ 180. “Temos um centro de convenção e as mineradoras sempre promoviam eventos aqui. Agora, tem três meses em que não há nada”, diz.
Em Diamantina, no Vale do Jequintinhonha, a situação já faz com que haja demissões no setor da hotelaria, principalmente em locais tradicionais da cidade. Segundo Jaqueline Araújo, da Pousada do Garimpo, a cidade vive um dos períodos mais fracos de turismo. “Fazemos promoções com descontos de 30% e mesmo assim estamos com 50% de taxa de ocupação para a Semana Santa. Não sabemos se é a falta de divulgação ou a crise econômica que tem feito os turistas a não virem. Tivemos que reduzir nosso quadro de funcionários de 35 para 32 e acho que vamos enxugar mais. Outras pousadas têm feito o mesmo”, conta.
Em outro roteiro tradicional de Minas, Tiradentes, o quadro é o mesmo. Aline Garcia, presidente da Associação de Empresários de Tiradentes, conta que, geralmente, nesta época do ano, os pacotes de Páscoa estariam todos fechados. “Ainda há muitas vagas. Nós temos feito ações com os empresários para informar como driblar a crise. É uma preocupação real”, diz. Na Pousada Tiradentes, o gerente José Nildo Flor da Silva conta que os preços das diárias cairam de 10% a 20%, e para o pacote da Semana Santa, a redução foi maior: passou de R$ 1,4 mil, no feriado de 2014, para para R$ 1mil. “Não está fácil para nenhum de nós. A diária normal ficou mais barata e ainda temos vagas”, comenta Vanessa de Paiva, gerente da Pousada Neuza Barbosa.
Em São João del-Rei, a história se repete. “Já tivemos taxa de ocupação de 100%. No ano passado, a gente indicava outras pousadas a quem procurava, tamanho era a demanda. Hoje, os outros locais nos ligam para saber se temos alguém para indicar”, comenta Cátia Regina, funcionária da Pousada Casa dos Contos.
Enquanto a maioria das pousadas das cidades histórias tem como alvo um público de classe média e sofre com a crise, há estabelecimentos que ainda registram uma boa procura. São aqueles que atendem a clientela de maior poder aquisitivo. É o caso da pousada Pequena Tiradentes, em Tiradentes, onde, segundo a gerente comercial e de marketing, Gabriela Barbosa, não houve redução nas tarifas. A diária passou até por aumento: de 10% para dias normais e de 20% a 25% em feriados. “Para a Semana Santa, temos 85% dos quartos ocupados, sendo que a menor diaria varia de R$ 3,2 mil a R$ 5,8mil para as três noites”, comenta.
Em Ouro Preto, segundo o gerente do Hotel Solar do Rosário, Niley Ulhoa, com a alta do dólar, o brasileiro tem procurado as cidades do interior e para a Semana Santa o estabelecimento está com 100% de taxa de ocupação. No local, as diárias variam de R$ 325 a R$ 865. (LE)
*Com informações de Estado de Minas