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Começa hoje julgamento de anestesista que abusou de paciente

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Vítima de anestesista em parto: 'A gente não tinha um sorriso em casa'.

Cerca de quatro meses após o médico anestesista Giovanni Quintella Bezerra ser preso em flagrante em São João de Meriti, na Baixada Fluminense, por estupro durante o parto do terceiro filho,de uma dona de casa de 34 anos. Sua identidade será preservada a pedido da vítima. Bezerra será julgado a partir de hoje. Moradores de uma das áreas mais pobres do estado, ela e o companheiro, um ajudante de obras que está ao seu lado há 17 anos, são assistidos pelo trio de advogados Francisco Valdeir de Almeida, Robson Dias Santiago e Francisco Bandeira de Lima. Eles pedirão indenização por danos morais ao estado e ao médico. Durante o encontro, o neném de 4 meses permanece no colo da mãe e gargalha a cada aceno. Somente há três meses pôde ser amamentado, já que a mãe precisou tomar o coquetel anti-HIV.

            Bezerra será ouvido pela Justiça junto a todos os envolvidos no caso em uma audiência de instrução e julgamento. Também falarão a vítima e seu marido, além de oito testemunhas de acusação e oito de defesa, mais a perícia. Bezerra vai depor por videoconferência direto de Bangu 8, presídio do Rio de Janeiro. Ele foi preso após enfermeiras da equipe do Hospital da Mulher Heloneida Studart que participavam do procedimento suspeitarem do seu comportamento e da grande quantidade de sedativo que dava às pacientes. Aquela era sua terceira cirurgia do dia, e as profissionais decidiram filmar o homem com um celular escondido. Na imagem, vê-se Bezerra colocando o pênis na boca da paciente. Novas imagens, divulgadas na última semana, mostram que ele desligou o alarme que monitorava a grávida durante o estupro gravado. Bezerra é acusado de estupro de vulnerável, e a pena vai de 8 a 15 anos de prisão. Para os advogados da vítima, ele tem característica de perversão sexual e deve ser condenado.

            “Estava muito segura no dia do parto, principalmente porque meu marido não conseguiu acompanhar o nascimento de meus dois primeiros filhos, uma menina de 10 e um menino de 8, e a gente finalmente teve essa chance. Já na sala de cirurgia eu falei para o anestesista que estava me sentindo mal e com muita vontade de ir ao banheiro. Ele me mandou ter calma, explicou que iria me aplicar a anestesia e pediria para alguém colocar uma sonda. Mas quem colocou foi ele, penso que a intenção dele já começou ali. “O único momento de alívio que tenho daquele dia é quando eu me lembro do médico levantando meu filho por cima do lençol e do meu marido segurando minha mão. Depois começa o pesadelo. Ele [Bezerra] destruiu tudo que planejei. Meu marido ficou ao meu lado até o momento do parto. Quando o neném nasceu, ele me mostrou, tiramos foto, beijei meu filho. Depois apaguei. Eu fiz laqueadura e tudo aquilo aconteceu durante o procedimento, quando meu marido já não estava na sala. Acordei desesperada, tentando abrir o olho. Queria falar que tinha uma coisa na minha boca, queria cuspir, mas não conseguia, então eu engoli achando que era alguma coisa minha. Sentia muita dor. Perguntei para o anestesista o que estava acontecendo, e ele só respondeu que eu estava enjoada. Mas sabia que estava acontecendo alguma coisa, porque vi duas enfermeiras se abraçando e chorando. Soube de tudo o que aconteceu dois dias depois. Ele marcou a minha vida, a vida do meu filho, a do meu esposo. É uma dor eterna. Graças a Deus não rejeitei meu filho. Olho para ele e sinto aquela dor, mas o que me conforta é saber que ele está bem e que não aconteceu o pior comigo. Quando a gente chegou em casa, meus filhos esperavam aquela alegria, mas não tinha. Eles ficavam andando atrás de mim, curiosos, e eu não conseguia falar nada. Era só silêncio, sem televisão e rádio ligados. A gente não tinha um sorriso dentro de casa. Cuidamos bem do nosso filho, com carinho, mas o sentimento de pai e mãe veio atrasado. Não tínhamos com quem conversar, porque só minha irmã sabia. Foi ela quem me deu a notícia, me abraçando e chorando. Demorei dois meses para contar para minha mãe. Um dia, passou a reportagem na televisão sobre o caso e minha filha perguntou se era o mesmo lugar onde dei à luz, e falei que deveria ser outro parecido, mas ela é esperta e não acreditou. Me viu chorando, me abraçou e pediu para que eu não ficasse triste. Tive que tomar coquetel anti-HIV, mas, primeiro, não falaram que eu teria que parar de amamentar. Uma semana depois, me senti muito mal e o olho do meu filho ficou amarelo. Tive que voltar ao mesmo hospital do parto. Fiquei tensa, mas era necessário estar ali. Quando as médicas viram a situação, suspenderam a amamentação. Meu filho ficou um mês sem leite materno. Foi horrível. Fiquei usando uma bombinha para tirar o leite e não empedrar. Foi o que mais me feriu, porque tive dificuldade em amamentar meus outros filhos, e com esse meu caçula estava esperando amamentar direito. Não estou muito bem psicologicamente. Tive uma consulta com uma psicóloga logo que tudo aconteceu. Quinze dias depois já era outra profissional, que sumiu. Não fico com a porta aberta e tenho medo de sair sozinha ou mesmo ir a consultas. Também tenho pesadelo de que um homem está entrando no quarto, ou que outro está fazendo aquilo comigo. Toda vez que meu filho completa mais um mês de vida, fico feliz e ao mesmo tempo me lembro de tudo. Quando ele fizer aniversário, isso certamente virá na minha cabeça. Mas não queremos contar para ele o que aconteceu porque achamos que, se ele souber, pode se sentir culpado. Eu mesma não me sinto culpada, mas no começo ficava pensando o porque se era por causa do meu jeito de me comunicar com as pessoas. Espero que ele fique bastante tempo preso para não ter a oportunidade de fazer de novo.’’